“Zombies Dictator” é
uma música da banda Almah, lançada no álbum Motion, de 2011. Composta por Edu
Falaschi, mas interpretada por ele e Victor Cutrale, este é um dos fatores que
chamam a atenção na música: dois vocais, um melódico e um gutural. Além disso,
há um “peso” e intensidade muito fortes na canção.
A letra, assim como os vocais, divide-se em duas partes, uma agressiva e
questionadora, e a outra, melódica e esperançosa. Farei uma tradução um pouco
diferente das que existem por aí, deixando outras possibilidades:
Ditadores zumbis
Como podemos viver com isto/este
Poder e miséria?
Eles lutam
Ou mandam outros lutarem por eles?
Alguém morre em vão
Porque alguém semeia o medo.
O que você vê?
Um futuro em uma rua sem-saída.
Há um motivo para restringir
Limites e liberdade: você fica forte!
Disfarce sua fé por trás de armas
Ditadores zumbis.
O povo come pão apodrecido
Enquanto suas almas destrutivas
Fazem um brinde
À indústria da morte.
Há um motivo para restringir
Limites e liberdade: você fica forte!
Disfarce sua fé por trás de armas
Ditador de zumbis
Há um motivo para resistir
A imposição do Terror!
Todos nascem livres
Ditadores zumbis
Morra
Você conduz o inferno através das colinas sem esperança
Você prevê toda a desgraça do Oeste
Morra
Empunhe armas e mire na cabeça
E adorne/decore o deserto com o sangue.
Salve-nos agora
E queime no inferno com sua máfia/gente.
//
Logo ao ler, percebe-se a diferença de pensamentos do
eu-lírico, que, de tão diferentes, ainda mais com as diferenças de estilo e
vozes utilizadas, pensa-se ser dois, mas são apenas dois sentimentos
diferentes.
A música inicia-se muito agressiva, é uma das mais
pesadas da banda, com um eu-lírico que questiona sua própria posição: como
podemos viver nesta situação, com este tipo de poder, com esta miséria?
É um chamado de consciência para nós mesmos, neste cenário onde a política, o poder, não age conosco, mas brinca. E termina a estrofe com a pergunta “Eles lutam ou mandam outros lutarem por eles?”; tratando-se de governantes e falsos líderes, o verbo “lutar” pode ser trocado por outros, “trabalhar” é um deles. No campo dos ditadores (que não foge muito do campo dos governantes), lembremo-nos das guerras, onde os soldados apenas seguem ordens de lutar, de representar o país, enquanto os ditos “representantes do povo” não fazem nada — na verdade fazem a “briga”; pois a luta não é de interesse da população.
É um chamado de consciência para nós mesmos, neste cenário onde a política, o poder, não age conosco, mas brinca. E termina a estrofe com a pergunta “Eles lutam ou mandam outros lutarem por eles?”; tratando-se de governantes e falsos líderes, o verbo “lutar” pode ser trocado por outros, “trabalhar” é um deles. No campo dos ditadores (que não foge muito do campo dos governantes), lembremo-nos das guerras, onde os soldados apenas seguem ordens de lutar, de representar o país, enquanto os ditos “representantes do povo” não fazem nada — na verdade fazem a “briga”; pois a luta não é de interesse da população.
Na segunda estrofe percebe-se o pessimismo de uma parte
do eu-lírico. “Alguém morre em vão porque alguém semeia o medo”, na verdade,
não é somente uma pessoa, mas várias que morrem em vão, lutando por falsas
verdades (ideologias), lutando contra a mentira espalhada, lutando por um fato
dito consumado, inexorável. E termina com uma projeção do lado ruim do eu-lírico;
muitas vezes, o ser não possui escapatória: ou luta e morre pelo o que foi
ordenado, ou luta e morre por ter se rebelado. É uma rua sem-saída.
Neste momento, a sonoridade da música fica mais devagar e
é o Edu quem canta, com uma visão diferente das duas primeiras estrofes, ele diz
que há uma razão para tudo isso, que é ficarmos mais fortes. É como se fosse um
pensamento para enganar a si mesmo, típico de algumas pessoas que não agem para
mudar o seu meio (lembremo-nos do primeiro e do segundo verso) ou não entendem
como funciona o sistema/realidade, e arranjam desculpas ou convencem-se, de
verdade, que há um motivo para tais atos acontecerem. Mas percebamos que
enquanto uma parte do eu-lírico vê uma rua sem-saída, só vê os lados negativos,
diferentemente, este vê um lado positivo.
No entanto, esse eu-lírico, mesmo que pensando diferente
quanto ao futuro, é consciente da realidade do presente, pois mostra que sabe
que esses “ditadores zumbis” apenas aparentam serem bons, disfarçando-se atrás
de armas. É interessante percebermos esse termo “zumbi”, pois mostra que os
ditadores já estão mortos (como seres humanos, que, por ser assim, são
entendidos por essa parte do eu-lírico como bons, assim como ele. É uma
projeção), mas ainda pensam em matar.
Em seguida retorna a parte agressiva do eu-lírico e da
música, comparando e diferenciando as realidades do povo e dos ditadores/políticos/ricos;
enquanto uns comem pão apodrecido e vivem na miséria (a miséria é citada no
segundo verso), outros tomam drinques, comemorando o poder (citado também no
segundo verso) e lucros conseguidos pela indústria da morte. Devemos perceber que o
povo, por estar vivo, come, alimenta o corpo; os “zumbis”, por estarem mortos, alimentam a alma.
Novamente, volta a parte melódica da música, o refrão, mas
acrescentado de algumas ideias. Se antes o eu-lírico acreditava que havia um
motivo para tudo isso, aceitando a realidade, agora já diz que há um motivo
para resistir a essa imposição de terror, pois todos nascemos livres. Nascemos
livres, mas ao longo da vida prendemo-nos a lugares, pessoas e ideias de outras
pessoas, deixando de sermos o que somos ou éramos.
Logo após isso, retorna a agressividade e o “pedido” (mas
por estar gritando, o pedido torna-se ordem) para que esses ditadores morram.
Este trecho é muito interessante, pois mostra o quanto após vivermos sob a
violência, se nos deixarmos levar por ela, tornamo-nos violentos também.
Esse trecho é a concretização de uma frase, que gostaria de citar aqui, do filósofo Nietzsche, em que ele diz: “Aquele que luta contra os monstros deve vigiar para não se tornar um deles. Ora, quando teu olhar se fixa por muito tempo no fundo de um abismo, o próprio abismo penetra em ti.” (NIETZSCHE, 2013, p. 107). Se não tomarmos cuidado, agimos da mesma maneira dos que estão ao nosso redor, tornamo-nos a essência de nosso oposto. É o caso de policiais que agem como bandidos, ou cidadãos que agem como políticos, por exemplo.
Esse trecho é a concretização de uma frase, que gostaria de citar aqui, do filósofo Nietzsche, em que ele diz: “Aquele que luta contra os monstros deve vigiar para não se tornar um deles. Ora, quando teu olhar se fixa por muito tempo no fundo de um abismo, o próprio abismo penetra em ti.” (NIETZSCHE, 2013, p. 107). Se não tomarmos cuidado, agimos da mesma maneira dos que estão ao nosso redor, tornamo-nos a essência de nosso oposto. É o caso de policiais que agem como bandidos, ou cidadãos que agem como políticos, por exemplo.
O ritmo da canção muda, ficando novamente lento, melódico,
mas mais carregado, e a parte “boa” do eu-lírico diz que os ditadores conduzem,
lideram, controlam o inferno, que seria nossa situação de vida, através das
colinas sem esperança, que são as nossas vidas, sem esperança de um dia melhor.
E termina por dizer que eles preveem toda a desgraça do oeste. O oeste,
sendo o lado em que o sol se põe, dando início à noite e escuridão, pode-se
pensar que signifique o fim de tudo, o fim da vida, que eles preveem, pois eles
mesmos o causam. Ouve-se novamente o pedido, a ordem, o desespero para que
morram.
Deve-se prestar atenção à sonoridade da música também, pois
neste momento todos os instrumentos alinham-se para que, juntos, façam um som
similar ao de uma metralhadora, o que tem tudo a ver com a letra da música, com
a agressividade de uma parte do eu-lírico e com as ações dos ditadores.
Após o solo, dá-se início à última parte “inédita” da
música. Percebamos que antes do “Morra”, o eu-lírico apenas se questionava, mas
agora ele dá “respostas” típicas de ditadores contra os próprios ditadores:
“Empunhe armas e mire na cabeça/ E adorne/decore o deserto com o sangue./
Salve-nos agora/ E queime no inferno com sua máfia/gente.” — essa estrofe não
necessita de explicação. É a realização da frase do Nietzsche, aquele que
lutava contra monstros, tornou-se um também; tornou-se zumbi, que só pensa em
matar o outro. Depois disso só repete-se o refrão e os gritos de “morra”. É uma
luta.
Antes de finalizar eu gostaria de dizer que quando fui
fazer esta análise/interpretação, pensei muito em quem seriam os zumbis: o povo
ou os ditadores? Pois o zumbi é uma criatura facilmente enganada, tal como o
povo; ao mesmo tempo, os zumbis perdem sua consciência humana e apenas pensam
em matar, que é o caso dos ditadores. A tradução seria “Ditadores de zumbis" ou
"Ditadores zumbis"?, acabei optando pela segunda opção. Sendo a arte subjetiva,
fica a critério de cada um, desde que embasado nas explicações.
Liderada pelo vocalista Edu Falaschi, Almah é uma das
maiores bandas brasileiras de Heavy Metal do país. Após participar do Rock In
Rio e excursionar pela Europa e Estados Unidos, o grupo lançará seu novo álbum
em 2016, sendo o mais recente de 2013, Unfold.
Referências
NIETZSCHE, Friedrich W. Além do Bem e do Mal. São Paulo: Editora Escala, 2013.
Muito boa análise, parabéns!
ResponderExcluirMuito boa análise, parabéns!
ResponderExcluirMuito obrigado, Renato!
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