sexta-feira, 29 de julho de 2016

O Power Metal, a música, a realidade e o futuro. Coincidências?

Todo artista está além da maioria de sua época, sempre percebendo características, normalidades, anormalidades e problemas de sua sociedade. Embora não se possa dizer que eles sempre nos trazem soluções, pode-se dizer que eles são como antenas de um povo, apontando sempre para as consequências e futuras necessidades, sejam locais ou universais; sejam conscientes ou não.

Se fôssemos filosofar (embasadamente em Schopenhauer), diríamos que é porque o artista se torna uno ao mundo, ele representa as coisas como elas são, como uma vontade de representação, mas não discutiremos o tema. Sabemos que isso ocorre independentemente do tipo de artista, mas aqui trataremos somente do músico, mais precisamente, do Heavy/Rock. Não será um texto longo, somente serão apontadas algumas pequenas e poucas coincidências.

Assim como é interessante o fato de pessoas, de diferentes lugares e épocas, terem feito músicas semelhantes, ou na letra ou no ritmo e melodia, sem que tenham se conhecido e ouvido umas às outras, também é curioso que indivíduos de uma mesma época, mas de lugares diferentes, tenham feito — na verdade, criado — uma sonoridade nova e relativamente parecida. Seria, talvez, uma intuição dos gênios?

Ao longo da história do Heavy/Rock vimos aparecer, em alguns períodos, vários tipos de bandas e gêneros: Hard Rock, Progressive, Punk, Heavy Metal e seus subgêneros etc. O que mais conheço, embora conheça pouco, é o Power Metal. É sobre ele que falarei.

Sabemos quais são as maiores características do Power: vocais limpos, agudos e em notas longas, guitarras rápidas, baixo rápido, bateria em bumbo duplo, solos em guitarras duplas, teclados, violinos, corais de vozes, letras positivas e fantasiosas, geralmente sobre lendas ou ficções medievais (até mesmo aristocráticas). Enfim, quase uma volta ao passado (por acaso o presente não possuía mais tal magia e encantamento? Um descontentamento com o real e presente?), uma utopia.

A questão do instrumental vem da vontade de pegar o que já estava sendo feito há um bom tempo por bandas como Deep Purple (por causa do guitarrista Ritchie Blackmore e do tecladista Jon Lorde), Rainbow (além do Blackmore, por causa do Dio e suas letras), Judas Priest (por conta do vocalista Rob Halford), Iron Maiden (não tanto pela técnica, mas velocidade do Steve Harris; e, também, pela potência vocal do Bruce Dickinson) e outras antes de 85, e levar além. Mas e a temática?

Dizemos que, no rock, o primeiro a iniciar esse tema foi o grande Ronnie James Dio, ainda no Rainbow; depois, no Black Sabbath e, por fim, em sua carreira solo. OK, Dio foi o primeiro num tempo em que ninguém fazia isso, mas, depois, no final dos anos 80 até a metade dos anos 2000, surgiram inúmeras bandas de Power Metal que, incansavelmente, trabalharam este tema. Não é uma mera questão de cópia e reprodução, mas sim, de identificação.

Dentre as primeiras bandas que iniciaram o que chamaríamos/chamamos de Power Metal estão o Helloween, da Alemanha; o Stratovarius, da Finlândia; e o Viper, do Brasil (há outras e de outros países, mas o texto será curto). Três bandas de e em locais diferentes que tiveram ideias parecidas quase ao mesmo tempo: metade dos anos 80, ainda período de guerra fria. Isto é, num momento de tensão, algumas bandas começaram a apontar não para a realidade, mas para a fantasia.

Na Literatura, principalmente no período do Romantismo e do Simbolismo, momentos de descrença, os poetas e escritores começaram a escrever sobre ideais, lugares exóticos, heróis (precisamente no Romantismo), liberdade, enfim, sobre fugas do real. O mesmo aconteceu neste período do Heavy/Rock, no Power Metal, mas enquanto aqueles, nos respectivos períodos, foram para o lado “negativo”, estes foram para o lado “positivo”.

Enquanto este gênero buscava fugir dessa atmosfera pesada, através de letras positivas e irreais, ao mesmo tempo, um outro movimento trazia à tona a realidade e o pessimismo — e até niilismo — do ser humano, vestindo uma roupagem do Hard Rock dos anos 70, mas mais “sujo” e carregado: o grunge.

No entanto, parece que o que mais prosperou foi o Power, não só na duração, que foi forte até a metade dos anos 2000, como também sobre o que ele buscava: a fantasia. Aquilo que o Power pregava veio de uma forma diferente e atingiu a quase todos a partir dos anos 90, e continua atingindo cada vez mais. A fantasia e a fuga do real vieram em forma de Internet. Não é real nem irreal, mas os dois de forma virtual e digital.

Pois bem, para onde as antenas dos artistas do Heavy Metal Melódico (para usar um “sinônimo”) apontaram, de certa forma, chegamos. Conforme a internet ficava mais popular, mais bandas desse gênero apareceram e se consolidaram. Como havia dito, não é somente moda e reprodução, é identificação. O artista observa, pressente e faz; o público se identifica, porque é realmente o que eles precisavam — ao menos naquele momento.

Quando a vontade não é mais aquela, quando o novo já é comum, perde a graça e some. Por isso, as bandas que vão na moda não duram: saturam. Hoje, quase todos possuem acesso à internet, ao mundo virtual, que é a fuga do real; hoje, quase ninguém mais monta uma banda de Power Metal que cante sobre fantasia e tudo o que virou clichê. Ainda há as bandas de Folk e outros gêneros, mas são outros conceitos e outros porquês. As próprias bandas clássicas e essenciais mudaram sua forma de tocar e compor, porque o mundo também mudou.

Fico pensando, agora, quais são e serão as bandas e artistas que estão, com suas antenas, apontando para o futuro? Serão mais necessidades ou consequências? Fico com receio se, a partir de agora, mais bandas vierem com a mesma ideia dos últimos álbuns do Megadeth e Dream Theater: a distopia. Coincidência, pois é o oposto da utopia (que em algum momento foi criada).

7 comentários:

  1. Excelente texto, infelizmente ao que parece o Power Metal está tendo a difícil missão de na arte/música narrar a distopia social.

    Agradeço pelo compartilhamento destas ideias.

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  2. Excelente texto, infelizmente ao que parece o Power Metal está tendo a difícil missão de na arte/música narrar a distopia social.

    Agradeço pelo compartilhamento destas ideias.

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    1. Obrigado, Douglas. Não sei se o Power Metal carrega essa missão. Mesmo que esteja, então vejo-o perdendo cada vez mais espaço. Alguns autores dizem que a arte não deve ter e nem tem missão nenhuma... senão não é arte, é panfleto. Eu prefiro aquela que possui uma mensagem, mas que tenha uma forma diferenciada também, para não ficar só conteúdo.

      Eu que agradeço.

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  3. Parabens pelo texto... acredito que a fantasia de mitos e herois que em algum momento irão representar de verdade os ideias sociais, seja inconcientemente o sonho de todos os mortais, por meio da religião, da musica e etc... A busca pelo passado representa que hoje a sociedade em geral esta mal representada... os herois não são mais descobertos naturalmente, eles se retraem frente a mare social que se apresenta... e a internet é uma das grandes culpadas... desinformaço imediata...

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    1. Muito obrigado, Tchok@. Os mitos e heróis representam as vontades das pessoas (para alguns, necessidades). Com certeza, a busca pelo passado é uma negação do presente. Acredito que o herói nunca existiu, posto que ele é perfeito; porém, quando alguém busca e vê uma pessoa como herói, significa que ela não está bem (vejamos os românticos, por exemplo, que eram idealistas frente à realidade indesejada). A internet, assim como pode mostrar algo, também pode esconder.

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    2. Concordo em parte... pois o heroi pode ser alguem do nosso convivio que conseguiu sobrepor obstaculos que o idealizador não conseguiu... é a visão externa da figura... diferentemente nos observamos em varios classicos do power metal a figura do heroi em dois momentos:a epopeia da conquista, porem apos a perda ou a derrota... claro isso na minha visão...


      bacana encontrar um espaço para discutir literatura, musica e etc com pessoas que aceitam a opinião adversa... bacana mesmo...

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    3. Sim, o herói, sempre que aparece, mesmo que morra, no momento da morte eleva seu ser, por isso continua no plano do ideal, não real.

      Que bom que gostou, Tchok@. Sempre que posso, respondo aos comentários.

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