Recentemente, em uma
ferroviária, enquanto esperava o trem, deixei de olhar para o chão ou para os
trilhos e mirei ao outro lado da estação, bem mais vazia do que o lado em que
eu estava. Dentre as pessoas que lá aguardavam, notei uma cena estranha, um
velhinho abaixado, fazendo algo que não consegui identificar num primeiro
momento.
Andei um pouco, para que meu
olhar ficasse de frente para o homem, pois, antes, por causa da
localidade de cada um, estava em diagonal. Percebi, então, que o velhinho estava
derramando a água de sua garrafinha sobre o chão, mas não aleatoriamente, naquele
piso cinza e feio, mas exatamente nas rachaduras, nas frestas daquele cimento
cinzento.
É fundamental falar as
cores, cinza e cinzento, porque onde o senhorzinho despejava sua água, lá
estava verde, lá havia vida. Nas frestas daquele chão, onde todos pisam todos
os dias, havia raminhos.
Alguns até podem achar graça de minha atenção a este caso, mas há gêneros específicos para isso, para fatos do cotidiano; então, caso você, leitor, não goste desse tipo de textos, feche esta página, não me leia. Outros podem dizer que aqueles pequenos ramos nasceram sem querer, mas como algo nasce sem querer?
Em primeiro lugar, há uma permissão à vida, se você não a tem, não pode viver — não entremos na pergunta “quem a dá?”, isso não interessa muito; mas que ela (a permissão) existe, sim, existe.
Alguns até podem achar graça de minha atenção a este caso, mas há gêneros específicos para isso, para fatos do cotidiano; então, caso você, leitor, não goste desse tipo de textos, feche esta página, não me leia. Outros podem dizer que aqueles pequenos ramos nasceram sem querer, mas como algo nasce sem querer?
Em primeiro lugar, há uma permissão à vida, se você não a tem, não pode viver — não entremos na pergunta “quem a dá?”, isso não interessa muito; mas que ela (a permissão) existe, sim, existe.
Em segundo lugar, é
necessário ter uma vontade pela vida, uma insistência, uma resistência, uma
luta a tudo que te implica ao seu redor. Só assim podemos surgir, podemos
aparecer e sermos percebidos, tal como a rama foi pelo velhinho, tal como o
velhinho foi por mim.
Mas não foi apenas a cena
que me motivou a escrever esse texto, e, sim, as perguntas que a cena me levou a fazer.
Por que regar um matinho entre as rachaduras do chão, umas folhinhas que
ninguém dá atenção, que todos passam por cima sem se preocuparem? Quanto tempo
durará aquela vida? Para que irrigar uma planta que, se crescer demais, terá de
ser cortada?
Isso diz o lado niilista (e cínico), que questiona a vida, mas a do outro, não a própria. Ora, a planta somos nós. Para que continuarmos, nos esforçarmos, lutarmos para viver, se morreremos? Também não sabemos quando iremos, também somos pisoteados, também não somos percebidos.
Isso diz o lado niilista (e cínico), que questiona a vida, mas a do outro, não a própria. Ora, a planta somos nós. Para que continuarmos, nos esforçarmos, lutarmos para viver, se morreremos? Também não sabemos quando iremos, também somos pisoteados, também não somos percebidos.
O que virá é menos
importante do que o que está. Por que regar? Porque ele quer, porque vale a
pena, porque é melhor o verde do que o cinza, porque é melhor existir do que
não existir. O final nem importa tanto.