FREIRE, Paulo. Pedagogia do
Oprimido. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz & Terra, 2014.
Pedagogia
do Oprimido, de Paulo Freire, é um livro forte. Nele, Freire busca explicar a
(triste) situação da maioria das pessoas/alunos e dá-nos possibilidades de
mudar esse contexto através do diálogo, através da libertação.
É dito
que, primeiramente, precisamos nos perceber no mundo, perceber a situação em
que estamos inseridos, mas só isso não basta. É necessário também
percebermo-nos como agentes de nossa própria história, e não como objetos
criados e manipulados pela elite do país/local.
O
problema do oprimido é muito grande porque, estando a vida toda preso a esta
visão, passa a acreditar que este é o real; e por sempre ter sido assim, é um
fato consumado. Principalmente por ideologias criadas pela mídia, como a
meritocracia, em que todos possuem a capacidade de melhorar de vida, mas se não
conseguem, é por incompetência do ser; ou a falsa generosidade, em que quem
está no poder, finge importar-se e ajudar quem precisa, mas o que acontece é
que este é um meio para as coisas continuarem como estão: quem está no topo
continua no topo (e passam-se por “bons”), e quem está embaixo continua
necessitado da ajuda de quem está no topo.
Para
libertarmo-nos é necessária uma verdadeira revolução. A questão é muito
complexa, pois, muitas vezes, o oprimido (e o “libertador” também) carrega o
opressor dentro de si, colocando-se (às vezes) contra os próprios companheiros
e desejando ser como os opressores; e quando não, desvalorizam-se, como diz Freire:
“A autodesvalia é outra característica dos oprimidos” (p. 69), acreditando que
são (por alguma “razão”, seja Deus, destino ou outra coisa) inferiores. Por
isso deve-se valorizar os oprimidos, valorizar sua visão de mundo, valorizar o
seu ser e ajudá-los (e assim, eles nos ajudarem e todos ajudarem-se) a serem/sermos mais,
a deixar de sermos coisas e assumirmo-nos como humanos, como homens e mulheres.
O método
que Freire nos propõe para esta transformação é o diálogo e a reflexão
contínua, pois “(...) a reflexão, se realmente reflexão, conduz à prática.” (p.
73). O diálogo tem de ser verdadeiro, não um monólogo. É falar para eles e com
eles — e colocar-se a ouvir também. Os temas a serem abordados devem ser temas
geradores, temas da realidade do povo, temas que se problematizem, e assim,
gerem outras problematizações/debates, desta forma criando conhecimento. Os
alunos devem perceberem-se como autores que atuam a própria vida;
percebendo-se, percebem o outro lado (a elite dominadora), e agindo — revolucionando
— acabam por libertarem-se
e libertarem o outro lado também.
É por
isso que Paulo Freire insiste tanto no uso do diálogo, porque dialogando são
dois (ou mais) seres agindo um com o outro, e não como fazem os opressores, em
que apenas um deles fala, depositando seus conhecimentos sobre o outro, como se
o outro não tivesse nada a oferecer, somente a receber — é
o que Paulo Freire chama de “educação bancária”. A educação bancária, além de
dar-se de “forma vertical” (um está acima e o outro abaixo), coloca o aluno
como alguém que tem que adaptar-se às coisas e ao mundo, retornando à ideia de
que são meros “objetos”, e não sujeitos.
Enfatiza-se,
também, que embora o educador não deva ser autoritário, não deve ser passivo. É
preciso que na relação educador-educando haja amor, humildade, fé, confiança e
pensamento crítico. Tudo isso é necessário para que haja o verdadeiro diálogo e
assim, a mudança do ser para o “ser mais”. Paulo
Freire nos adverte também para que não caiamos no erro de apenas mudar o oprimido
de lugar: antes, da elite; agora, “nosso”. Não é colocar a nossa visão sobre o
educando, é juntamente criarmos uma nova visão (e ação).
Devemos
nos diferenciar em tudo dos opressores: se eles não dialogam, dialoguemos; se
eles não causam revolução, mas sim, opressão, então causemos revolução e
libertação; se eles tentam manter-nos afastados, devemos unirmo-nos; se eles
pensam em “conquistar o povo”, não devemos conquistá-los, mas assumirmo-nos
como povo e fazermos parte dele, porque “Todo ato de conquista implica um
sujeito que conquista e um objeto conquistado(...)” (p.186), e ninguém deve ser
tratado como objeto.
Discute-se
muito sobre a alienação, algo que sempre temos de lutar contra, despertando o
verdadeiro pensar. A elite teme isso, tanto que “(...) em certos níveis seus,
até instintivamente, usam todos os meios, mesmo a violência física, para
proibir que as massas pensem” (p.201).
O
opressor, ao mesmo tempo em que aliena o oprimido, invade sua cultura e vida, e
o oprimido, por estar alienado, não percebe. Nas palavras de Freire: “(...) Os
invasores atuam; os invadidos têm a ilusão de que atuam, na atuação dos
invasores” (p. 205), assim, os oprimidos terão sempre em mente a cultura da
elite, “(...) quererão parecer com aqueles: andar como aqueles, vestir à sua
maneira, falar a seu modo” (p. 207). É por isso que a invasão cultural é uma
violência e manipulação; é por isso que se deve conscientizar as pessoas ao
máximo para que, com elas, superemos a falsa cultura, passemos a criar a
verdadeira cultura, a sermos seres culturais, ao invés de sermos
criados/moldados à forma do outro.
Não
trata-se de conquistá-los, mas de colaborarmos uns com os outros. “O que
distingue a liderança revolucionária da elite dominadora não são apenas seus
objetivos, mas seu modo de atuar distinto (...)” (p. 226). Ninguém se liberta
sozinho, mas ninguém doa liberdade a alguém, é um processo em que um ajuda o
outro a se formar, a ser mais. “Daí
que não possa a liderança dizer sua palavra sozinha, mas com o povo. A
liderança que assim não proceda, que insista em impor sua palavra de ordem, não
organiza, manipula o povo. Não liberta, nem se liberta, oprime.” (p. 243).
Por fim,
é isto que Paulo Freire busca neste livro, a luta e a crítica à realidade em
busca de melhorias; a busca ao diálogo; à libertação e ao engajamento dos povos
nos processos sócio, histórico e culturais; a busca à valorização da vida. Como
ele diz sobre o próprio livro: “Todo nosso esforço neste ensaio foi falar desta
coisa óbvia: assim como o opressor, para oprimir, precisa de uma teoria da ação
opressora, os oprimidos, para se libertarem, igualmente necessitam de uma
teoria de sua ação.” (p. 252).
Conclusão
Este
livro mostra o quanto a realidade é complexa e exige uma postura radical — uma
verdadeira revolução — para caso queiramos mudá-la. Paulo Freire demonstra e
explica como funciona o sistema opressor, suas táticas, ideologias e suas
consequências sobre o outro.
Não só
isso, ele também mostra e cria formas de combater esta violência, que é, em
primeiro lugar, dialogar com os oprimidos. Para libertar-nos, precisamos estar
junto dos outros e estes, nos ajudando a libertar-nos, libertam-se também.
O livro
diz que não somos salvadores ou libertadores do povo, mas que devemos aprender
a sermos construtores de nossa própria vida, porque somos humanos, não somos
objetos. E que, para acontecer uma verdadeira revolução, devemos ser
verdadeiros conosco e com os outros: não é fazer-se diferente, mas fazer-se
semelhante; não é falar para o povo, é falar com o povo, sobre o povo e sobre o
mundo, isto é fazer-se e fazer o mundo.